O jornalista Fernando Lemos lança seu olhar crítico e provocativo sobre temas atuais, alimentando um debate sobre o Ponto de Interseção ao qual a Humanidade vem se submetendo para desfrutar dos "benefícios" da modernidade, sob a ótica da Naturologia e de um dos mais importantes gurus do ideal naturopata, Efraín Melara.

terça-feira, 20 de março de 2007

Indo além do chamado do beija-flor

Desde que o homem-mulher se desconectou da natureza, passando a se alimentar de qualquer coisa, sofreu um curto-circuito que o levou à busca de ser o que não é, porque havia rompido com o ser real. E inventou a doença. Doente, como nenhum outro bicho fica desde que siga a programação da natureza, perdeu os instintos e passou a uma busca frenética por dominar a natureza, por desenvolver-se, por “entender” o mundo e a si mesmo. Único bicho capaz de pensar - a ter, em tese, o que se chama de livre arbítrio -, inventou o tempo, inventou a morte e começou o que chamou de história.

Da mesma forma que, no seu próprio corpo, poluía seus rios, destruía sua fauna e sua flora, assim passou a agir do lado de fora, sem perceber, porque sufocou seus instintos, que é apenas uma parte de tudo que existe, e de que tudo que existe é parte dele. De que tudo que existe faz parte de uma grande unidade.

Aí, inventou os deuses para substituir essa conexão que ele mesmo destruiu. E sintetizou os deuses em um só deus para facilitar a dominação de uns pelos outros. E cercou a terra e declarou que ela pertencia ao mais forte, inventando a propriedade privada. E depois inventou os países, as nações. E também inventou as guerras, porque, se as terras pertenciam a pessoas, a países, a nações, cabia tomá-las para expandir-se, para acumular mais terras. Aí, inventou o dinheiro e colocou valor nas coisas que foram dadas a ele de graça. E inventou o comércio.

E como sofria com os sintomas que afetavam sua saúde, que prejudicavam seu rendimento como soldado, como comerciante ou como “cidadão” - então apareceram os médicos que tratavam de “curar” os sintomas, sufocá-los com produtos químicos. E foram surgindo os “especialistas”. E o homem traçou um círculo em torno de si mesmo, destruindo todo o seu potencial. E passou a viver dentro do círculo, segundo regras que foi estabelecendo e modificando de acordo com o que os objetivos do que chamou de civilização e desenvolvimento. Objetivos contra a vida.

Passou a viver uma vida paralela que destrói a vida. Que criou as instituições que não permitem que se escape do círculo – as escolas, as igrejas, os governos, os hospitais, a polícia, a família. Uma vida ilusória, onde todos e cada um perseguem o santo graal enquanto se afastam de sua essência, transformados em humanóides que caminham para a destruição como bois para o matadouro. Que se multiplicam como coelhos mundo afora, criando a superpopulação que esgota os recursos naturais.

Depois dessa ruptura, cada pessoa já nasce com uma nacionalidade, com uma religião e com regras morais coerentes com a nacionalidade e a religião. E comprometida com o tempo, é claro, porque essas regras são mutáveis, vão “evoluindo”. Chamam isso de evolução. E, como o homem se afasta cada vez mais de sua essência, já não é capaz de saborear a vida, não enxerga o êxtase de simplesmente existir e se entrega a essa vida paralela, complexa, correndo atrás de poder, dinheiro, patriotismo, sucesso, fama, desenvolvimento, cura. Cada vez mais distante da essência e da simplicidade, que já nem enxerga. O que chamam deus é a saudade da originalidade perdida.

Mas o fato é que alguns primeiro enxergam o círculo e entendem que ele é uma prisão. E, porque entenderam que estão numa prisão começam a tentar escapar dela. E alguns poucos conseguem. E, quando conseguem escapar, passam a enxergar as coisas de forma cada vez mais clara. E quem enxerga a realidade como ela é assume também uma enorme responsabilidade. Só quem enxerga a realidade como ela é assume essa responsabilidade, de viver de acordo com o seu ser, com a natureza e de ser uma unidade com tudo e todos. Pessoas que assumem essa responsabilidade passam a ter relações frescas com as pessoas: renovadas a cada momento. Sem a memória psicológica. Sem nada nos escaninhos.

E quem assume essa responsabilidade não pode se colocar do ponto de vista de quem está dentro do círculo. Tem que se colocar do ponto de vista de quem está fora do círculo da assim chamada vida, enxergando as coisas como elas são de fato, abandonando a descrição que nos fazem do mundo, ou não se conformando mais com ela. E mergulha na inteligência infinita, que começa quando a pessoa se coloca como testemunha dos pensamentos. Saber o que pensa. Saber como pensa. Saber de onde vem o pensamento. Ser observador desse processo. Se apartar. E, de fora, enxergar o real. Inteligência infinita que nos pertence desde sempre, e só a cada um.

Temos que entender como funciona este jogo: uma situação nos leva a buscar nos arquivos da memória uma reação. Mas não fomos nós que montamos os arquivos. Foram os pais, os padres, os médicos, os professores, a cultura, o conhecimento, gente que ficou na poeira da história. Não é o caso de rearrumar os arquivos, selecionar algumas idéias-força para deixar no arquivo, outras para tirar dele. O arquivo em si é o problema. Somos levados pelos pensamentos, pelos desejos, pelos condicionamentos, pela nossa cultura, pelo que nos introjetaram, pelo que nos introjetam a cada instante. A mente nos monta uma armadilha a cada instante. Nós estamos na rua, vemos um outdoor, nosso pensamento nos transporta a um desejo. Vemos a TV, a mesma coisa. É assim que funciona. Um jogo.

Por isso as duas coisas são importantes: recobrar o equilíbrio, se re-colocar em contato com a natureza e jogar o lixo fora, entender o mecanismo do pensamento, transformar o pensamento em servo, não deixar que ele seja o senhor - e, o que é pior, um senhor que não sabe de onde vem ou para onde vai. Um senhor desgovernado. Atenção. Estar atento. Viver cada momento. Homo sapiens sapiens. Que não é conduzido pelos pensamentos. Que não é escravo da cultura, dos vícios, dos condicionamentos, da história, da humanidade, das ideologias, dos dogmas, das religiões, da civilização, do conhecimento formal que diz respeito a uma civilização doente criada por homens doentes que se apartaram da natureza como se fosse possível a perna decidir ser independente do resto do corpo. Assumir o comando. Afastar as nuvens do pensamento e do diálogo interno interminável. E enxergar, pela primeira vez.

Todos nós somos “buscadores”, mas procuramos, às vezes, de uma forma confusa, apenas transgredindo. Ou temos “insights”, depois recaímos. Ou vamos e voltamos. Porque somos uma multidão, e nada que vem do diálogo interno permanece. Porque o “eu” que tomou uma decisão hoje, não é mesmo “eu” que desrespeita a decisão amanhã.

Por isso sou adepto da chamada Naturologia, para me manter numa caminhada que nunca acaba, mas também não cansa. Quem anda só com os pés não se cansa. Porque é a cortina de fumaça criada na cabeça, com os desejos, objetivos, metas, que nos impede de enxergar. Entre nós e a realidade está a cortina de fumaça do círculo da “civilização” nascida da doença básica do homem, do seu pecado capital: a desconexão da natureza a partir da decisão de comer qualquer coisa, desprezando o instinto, desrespeitando as leis biológicas. O que levou à doença. E ao resto, como conseqüência. E homens doentes só são capazes de criar relações doentes, uma civilização doente, sociedades doentes.

Com a Naturologia começamos a enxergar o círculo da civilização doente que o homem-mulher foi capaz de criar. Mas não é possível mudar as pessoas de dentro do círculo. Porque não é possível, dentro dele, que as pessoas enxerguem o real. As nuvens de pensamentos não deixam. Os vícios não deixam. Os condicionamentos não permitem. Não podemos continuar presos no trânsito da humanidade – por sinal, cada vez mais “engarrafado”. Não podemos mais nos preocupar com nações, ancestrais, ideologias, religiões.

Nada disso existe, de fato. O que existe é o indivíduo conectado com essa energia que está em tudo e está em todos. Mais do que conectado: imerso nela. Lutar contra o que não existe é fazer parte do jogo. Aquele que acredita em deus e aquele que acredita que não acredita em deus dividem a mesma energia, em pólos opostos.

Devemos nos colocar totalmente fora do círculo. Não pensar descontroladamente e viver totalmente o aqui e agora. Evitar ficar “ocupado”. Estar em cada momento, sem passado e sem futuro, e não tropeçar em distrações. Saltar no abismo – o abismo da eternidade.

A mudança, através da Naturologia, é dolorosa. Por causa dos vícios. Dos condicionamentos. Da história pessoal de cada um. Dos pensamentos. Que não são nossos, são emprestados, são frutos de todos os vícios, todos os condicionamentos, de toda a história da assim chamada humanidade. Se estivermos atentos, é fácil ouvir, por trás dos pensamentos, a voz dos donos dos pensamentos que afloram na mente, desordenadamente.

Não basta, no entanto, equilibrar o organismo, é preciso limpar a mente através do silêncio. Assim funciona a Naturologia: não basta eliminar a causa, que são os hábitos errados, a alimentação inadequada, é preciso desintoxicar o organismo, limpá-lo do que ele acumulou através de anos e anos de ignorância. Da mesma forma, temos que proceder com a mente, com a cultura, com a civilização – limpar o lixo acumulado. Entender o mecanismo da mente. Jogar o lixo fora. Não acumular mais lixo. Porque não existe efeito sem causa.

Não participar mais do trânsito da humanidade. Olhar de fora. E ao mesmo tempo estar dentro. Estar no mundo. Mas não ser mais do mundo. Deste mundo. Ser do mundo que deveria existir se o homem não tivesse rompido com a natureza, com seu próprio ser, um mundo sem história, mas com êxtase. Controlar a loucura para poder participar deste mundo. Mas sem se identificar com ele. Sem ilusões. Não dedicar nada a ninguém. Fazer as coisas sem buscar metas.

O que fazer agora? “Consertar” o mundo de dentro é impossível. Mas podemos mudar pessoas. De fora. Dentro, mas fora. Cada indivíduo é um exército. O que nos resta fazer agora é mudar pessoas, desintoxicá-las da civilização, torná-las equilibradas. E, ao mesmo tempo, torná-las meditativas, silenciosas, atentas ao momento, a cada momento, capazes de ser homo sapiens sapiens. De conhecer a inteligência infinita. Ou a intuição. Os nomes não interessam. Não interessam as denominações, se são apenas formas de olhar o mesmo céu, mas de janelas diferentes.

Todas as pessoas, e são poucas, que foram capazes de enxergar o real na sua crueza e simplicidade, disseram a mesma coisa. Perceberam a mesma coisa. Viveram a mesma experiência. E foram destruídas ou tiveram suas palavras diluídas pelas pessoas sabidas que não conseguem enxergar, apenas ver. Que não conseguem escutar, apenas ouvir. Vêem e ouvem através de sua cultura, de seus vícios, de seus condicionamentos, de seus dogmas, das lentes escuras de seus óculos. De sua ignorância travestida de conhecimento.

E quanto mais cultas, mais poderosas, mais sabidas, quanto mais diplomas, quanto mais “poder”, maior a ignorância, porque a casca é mais dura, a couraça é mais resistente. Como dizia o poeta, há muito sabido pra pouco sabiá, sábio pássaro colorido.

O elo que faltava para seguirmos adiante era o conhecimento da Naturologia. Porque em equilíbrio as pessoas são meditativas de ouvido, não precisam “aprender” a ser. Em equilíbrio, os pensamentos não vêm e vão descontroladamente, “puxados” pelos condicionamentos, pela história, pela descrição do mundo que nos contaram, pelos desejos “implantados” em todos e em cada um por uma sociedade doente, desde muito antes de todos os cristos, ou desde quando o homem-mulher decidiu deixar o Jardim do Éden e provar do fruto da árvore do conhecimento, ou da árvore da ignorância metida a sabida.

Deixando de ser deus, deixando de ser parte da natureza, um com ela, um com o todo, o homem-mulher criou muitos deuses, e depois unificou todos os deuses num só para poder dominar com mais facilidade a multidão. O homem-mulher deixou de ser um e virou - ele mesmo - uma multidão. E que sofre influência dos astros, da família, da sociedade, dos poderosos de plantão e dos pequenos e grandes tiranos. E o pior é que não há luz no fim do túnel. Simplesmente porque não existe túnel. O túnel é imaginário. É uma viagem sem fim e sem volta. É só entender que não existe o túnel. E enxergar o real. Chega de ilusões!

O que percebemos é que há uma diferença básica entre aqueles que corporificam os dogmas, que se dizem religiosos, e aqueles que buscam sair do círculo, se apartar da multidão, viver longe dos ditames desta civilização doente que está conduzindo o planeta à destruição. Estas pessoas, os ”buscadores”, enxergam o que as pessoas chamam de “realidade” de fora, como testemunhas. Enxergam a multidão indo para o matadouro como uma boiada e se sentem solitários - como se estivessem no cume de uma montanha assistindo a banda do mundo passar.

O que buscam é o ser que foi abandonado pelo caminho, sufocado pelo ego criado pela doença básica do homem. O elo que faltava, repetimos, é a Naturologia. Instintivamente, essas pessoas tendem a ser vegetarianas. Muitas vezes por humanismo, porque não querem matar animais. Mas os animais que são mortos pelos verdadeiros carnívoros continuam vivos neles, energeticamente falando. Não há violência nisso – como nós entendemos a violência. O lobo adora o cordeiro, acha ele lindo, com aqueles cabelos naturalmente encaracolados, mas quando está com fome, come o cordeiro por instinto. Sem violência. Apenas come. Mas o homem-mulher, sim, é violento quando mata os animais – só por prazer, ou para congelá-los e comer depois, cozidos ou assados, com muito molho para disfarçar o gosto insuportável – para ele(a), que não é carnívoro por instinto - da carne crua e sangrenta.

O que precisamos é chamar estas pessoas para se re-ligarem com o corpo, com a matéria, com o equilíbrio que as remete de uma só vez para a meditação, para a compreensão do real. E o caminho é fundir a Naturologia com a meditação. Meditação como estratégia, porque o objetivo comum é abandonar passado e futuro e viver o momento. Temos que nos aprofundar na Naturologia, que nos leva ao estado meditativo, ao equilíbrio e à maior de todas as transgressões, porque num mundo globalizado e imbecilizado, que caminha para a autodestruição, não há nada mais transgressor do que a saúde, do que se reconectar com o todo.

Mas temos que buscar quem, mesmo sem compreender profundamente o pecado capital do homem-mulher, o de se apartar da natureza para se alimentar de qualquer coisa, alterando o equilíbrio funcional do organismo, conseqüentemente passando a desejar ser alguma outra coisa, e não o que era e é, e sem perceber que somos o que somos, e não podemos ser nada mais do que somos, e que o que somos já é perfeito em si, ser um grão no universo já é o bastante, mesmo assim empreendeu uma jornada para cair fora do círculo, de samsara, da ilusão que o homem-mulher criou, ou maya, superando os deuses para voltar a ser um com a natureza.

Temos que partir destas pessoas para chegar à síntese brutal da síntese, à simplicidade, ao óbvio tão difícil de enxergar. De transformar quantidade em qualidade. E qualidade de novo em quantidade. Como vive hoje, o homem-mulher não é mais do que uma máquina, um robô genético que age de acordo com seus condicionamentos, com o que lhe ensinaram. Que dá ordens a si mesmo – ordens que se baseiam na sua cultura, na sua religião, nos seus relacionamentos, no que lhe ditaram desde a infância. Ordens contraditórias. Ordens que, por sua vez, lhe são transmitidas numa cadeia sem fim. E mórbida.

Os melhores transgridem, como Osho, ou como Melara. São limítrofes. Buscam ultrapassar os limites da chamada normalidade. Alguns não sobrevivem. Não suportam. Suicidam-se ou vão parar nos hospícios. Ou mergulham nas drogas chamadas “ilegais” – embora tudo seja droga na nossa civilização. Essas pessoas precisam descobrir que a grande, a maior transgressão é não se permitir viver nem de acordo nem contra a cultura e a civilização. Nem contra, nem a favor. Nem enquadrado, nem revoltado. A grande transgressão é ser simples. A grande transgressão é ter saúde. Saúde dá barato. A grande revolução é o óbvio, o que está na cara, mas ninguém enxerga. A grande transgressão é ser natural.

O que os mestres chamavam de maya, ilusão, é esse mundo paralelo criado pelo homem-mulher doente, a partir do pecado capital – a ruptura com o programa da natureza. Nós passamos a acreditar na descrição que nos fazem do mundo, da vida. Mas a Naturologia, para as pessoas chamadas normais, acaba se transformando em mais um paliativo. As pessoas, no fundo, querem ser “curadas”, embora a Naturologia insista que não há doenças e que, portanto, não existe cura. E depois de um tempo voltam para suas vidinhas normais. E, aí, voltam os sintomas, e elas acham que não foram “curadas”, e acabam de novo, ou insistindo na Naturologia, ou caindo nas garras dos “bem intencionados” médicos, que sufocam os sintomas e “curam” as doenças, colocando essas pessoas de novo no mercado para serem “úteis” ao sistema.

O caminho não é adotar a postura de um professor - porque ninguém ensina ninguém, no sentido clássico de “ensinar”. Não adianta, apenas, transferir ou tentar transferir o conhecimento da Naturologia para outras pessoas. As pessoas ainda acreditam em nações, ainda perseguem ideologias, ainda acreditam de alguma forma em revoluções transformadoras, ainda acreditam em sociedades secretas mais inteligentes que dominam as pessoas mais ignorantes. Não que elas não existam: existem. Mas isso é irrelevante. Porque todos, dominadores e dominados, são vítimas da mesma ignorância básica, caminham todos para a mesma destruição, padecem todos das mesmas “doenças”. Não podemos julgar pela lente da normalidade. E não podemos dar crédito à chamada realidade. Mais ainda: nem contra, nem a favor, porque são dois lados da mesma moeda, são a mesma energia.

Pouco importa se há seres humanos (será que ainda são humanos?) que usam sua inteligência para impor seus dogmas, (des)orientar nossa cultura, dominar os povos, porque todos estão dentro do círculo de maya. É a mesma corrente da humanidade que está perto do impasse total e a caminho da destruição global e globalizada.

Devemos ter mais estratégia, atrair as pessoas certas, os “buscadores”, capazes de encontrar a inteligência infinita – pode chamar de iluminação. Sem a postura agressiva do “contra”. Temos que estar no mundo sem ser do mundo. Sem nos afetarmos, porém. Sem nos identificarmos. E de algum modo, quando nos colocamos contra, nos identificamos com todo esse lixo. A estratégia é trabalhar pessoas, fundir conhecimentos, se apartar, mas permanecer no mundo.

A meditação é uma estratégia para jogar fora o lixo acumulado nos escaninhos da memória, no chamado subconsciente ou no inconsciente coletivo, em conseqüência dessa civilização doente, criada, mantida e transmitida por homens doentes. A correia de transmissão é a cultura. A âncora é a história. Mas a meditação trabalha na conseqüência – o homem fora de seu centro, vivendo uma vida ilusória e anti-humana. Vivendo como máquina. Como robô genético. A Naturologia trabalha na causa – a desconexão com a natureza. E um encontro é possível – e bem-vindo. De uma certa forma, já houve esse encontro.

A Naturologia re-liga brutalmente o homem à natureza. E, aí, pode se dizer que ela é uma religião – a religião fundamental do homem. A religião natural do homem. Ou o estado natural do homem, o que é a mesma coisa. O homem-deus, porque vive em harmonia com tudo e todos. Com a natureza. Com sua natureza. Em equilíbrio. Em êxtase. O nada pleno. A Naturologia é voltar a fluir com a natureza. A Naturologia coloca o homem brutalmente em contato consigo mesmo, com sua natureza e sem intermediários.

A maior lição da Naturologia é ao mesmo tempo a mais simples: não existem doenças, portanto não existe cura. Existe equilíbrio. Ou existe desequilíbrio, que provoca sintomas, sinais de socorro que o corpo emite. Eliminando a causa e livrando o corpo do lixo que acumulou, usando apenas terapias naturais, sem nenhum tipo de medicamento, nem mesmo as chamadas “plantas medicinais”, o efeito – que são as chamadas “doenças” – desaparecem. É simples assim. Esse conhecimento simples e óbvio leva à compreensão de todo o resto.

Da mesma forma, não há “cura” para a humanidade. O homem-mulher, ao cometer o pecado capital de se desapartar da natureza, de tentar ser outra coisa diferente do que ele é, criou uma sociedade doente e competitiva, que busca o santo graal ou o tesouro escondido, que não estão em lugar nenhum. Que está nele mesmo – tão longe e tão perto, encoberto pela ignorância que nos é imposta. Uma humanidade que luta pela sobrevivência, ao invés de viver. Que busca o crescimento e o progresso, ao invés de viver. O que existe está aqui e agora. O tesouro ficou para trás - naquele homo sapiens sapiens que foi abandonado antes de começar a história. Uma história que começamos a contar a partir do ponto zero da ignorância básica do homem.

Criamos, então, a doença, depois a morte, porque o homo sapiens sapiens não morre, já que a energia não morre, apenas se transforma; depois o tempo, porque deixamos de viver cada momento para projetar os nossos desejos no futuro ou vivermos de acordo com nosso passado, (des)orientados por ele e pelos ditadores que nos “guiam”, família, professores, padres, pastores, governadores, presidentes, deputados, senadores e outros tiranos de plantão. São cegos guiando cegos. Depois criamos, a partir da doença, a cultura e essa civilização doente, e passamos a contar a história dela – que não é a história do homo sapiens sapiens. Porque o homo sapiens sapiens não precisa de história. Porque ele vive cada momento. Não tem passado. E planta o futuro a cada momento, vivendo de acordo com a natureza e o conhecimento do real. Aqui-agora.

Agora, cabe a quem enxerga tentar atrair quem busca. O trabalho de desintoxicação é do corpo, da mente, de tudo que nos enfiaram goela a dentro, dessa civilização, desse círculo que destrói o indivíduo como unidade e parte de toda existência. Mergulhar na inteligência infinita, que não acredita no que lhe contam e lhe descrevem e que tira coelhos da cartola todo o tempo, assumindo a santa insegurança da vida.

Em equilíbrio, o homem está em estado meditativo. É uma questão de linguagem. Porque o sistema a tudo dilui. Dilui a meditação. Dilui a Naturologia. Para que o homem-mulher jamais se encontre consigo mesmo. O homem-mulher se apartou da natureza e começou a contar a história de uma humanidade, uma cultura e uma civilização que criaram um centro falso, uma ilusão, um delírio que chamam de vida.

A meditação ajuda a desobstruir os canais, jogar fora o lixo, encontrar o silêncio, estancar o diálogo interno, permitir o encontro do homem com a natureza. Não a meditação que nos chega através da diluição de um conhecimento, que é filtrada pela sociedade. Mas a meditação entendida como uma técnica para nos fazer enxergar o óbvio. É o êxtase, estar em cada momento, estar em harmonia com a natureza, com tudo que está em equilíbrio, se contentar em ser uma onda no oceano da vida. Inteligência infinita é outro nome para o que os mestres chamam de iluminação: estar livre das amarras da ignorância.

Precisamos criar uma linguagem mais adequada para atrair pessoas que estão buscando sair do círculo de maya e encontrar o real, a verdade, o absoluto, que muitos ainda chamam deus. Para colocar essas pessoas no trânsito contrário ao fluxo da humanidade, e que é a favor do homem. Para sair do círculo. E isso é a Naturologia – e é meditação.

Na Índia, há uma seita chamada de adoradores do diabo. Se riscarmos em torno de uma pessoa dessa seita um círculo, ainda que de giz, ela não consegue sair. Nem dez homens conseguem arrancá-la do círculo. Assim é a humanidade: as pessoas não conseguem sair do círculo. A Naturologia faz isso. Mas as pessoas acham que estão sendo “curadas”, e voltam para dentro do círculo. E não conseguem sair dele, nem puxadas por dez homens. Por isso temos que criar uma linguagem que não “ensine” a elas, porque ninguém ensina ninguém, mas que faça com que elas vivenciem, experimentem, se tornem de novo uma unidade. A partir da Naturologia. E da meditação. Naturologia, equilíbrio, que leva à meditação. Meditação, que leva a viver de acordo com a natureza.

Temos que ter mais estratégia. A tática do choque, de lutar contra a sociedade, os médicos, os aproveitadores que manejam formas milenares e sutis de dominação, faz parte da linguagem do círculo. Afasta, não agrega. Assusta. Choca, mas não dá abrigo. Não temos que ser táticos, mas estratégicos. Da mesma forma, a meditação, sem buscar a síntese brutal da síntese, sem depurar o corpo, para que o equilíbrio orgânico nos facilite entrar em estado meditativo, mergulhar no silêncio, nos reconectando com o todo, é continuar na máquina do tempo.

Temos que buscar uma conexão – Naturologia e meditação. Limpar o corpo e tornar a mente serva. Equilíbrio. Silêncio. Inteligência infinita. Intuição. Porque a maior transgressão é ter saúde. É não depender da química industrial, da economia globalizada, do abate de animais, da multidão, do conhecimento acadêmico, da cultura e da civilização. Que a Naturologia chama de “sifilização”.

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi Fernando! Fico muito feliz por você compartilhar conosco essa sua privilegiada visão sobre o mundo. Que esse blog te traga muita alegria e que possa iluminar os pensamentos de todos aqueles que queiram enxergar além do óbvio. Parabéns!